Entre a Proteção e a Autonomia: Como Gerir os Paradoxos do Uso das Redes Sociais nas Crianças
- Cátia Castro
- 15 de abr.
- 3 min de leitura

Vivemos numa era em que o digital deixou de ser uma opção e passou a ser uma presença constante na vida de todos, inclusive das crianças.
Redes sociais, vídeos, jogos online e plataformas de partilha de conteúdo tornaram-se parte do quotidiano de muitos jovens, desde idades muito precoces. Este fenómeno trouxe consigo benefícios e riscos, oportunidades de aprendizagem e socialização, mas também exposição precoce, pressão social, problemas de saúde mental e exploração comercial.
A questão é: como podemos cuidar verdadeiramente do bem-estar psicológico das crianças num mundo digital que as empurra, simultaneamente, para a autonomia e para a vulnerabilidade?
Perante este dilema, entre empoderar e proteger, a proposta vai no sentido de que não devemos escolher entre proteger ou empoderar as crianças, ou seja, aprender a viver com esta tensão e a geri-la de forma responsável e equilibrada.
O paradoxo digital: entre o risco e a oportunidade
Por um lado, o uso das redes sociais pode fortalecer competências sociais, promover a expressão pessoal e oferecer espaços de pertença. Por outro lado, pode aumentar o risco de comparação social, ansiedade, exposição a conteúdos nocivos ou exploração comercial, especialmente quando falamos de crianças com menos capacidade para compreender as intenções por detrás daquilo que vêem ou partilham.
Ao contrário de uma abordagem binária (proteger ou empoderar), as tensões entre risco e oportunidade são inevitáveis, mas podem ser geridas com estratégias dinâmicas e cíclicas, ajustadas à idade, contexto e perfil da criança.
Quando é que estas tensões se tornam mais perigosas?
A investigação sugere que as tensões entre proteção e autonomia se tornam mais salientes em certas condições, vamos saber quais:
Quando a criança é mais nova e ainda não desenvolveu competências cognitivas ou emocionais para compreender a natureza da publicidade ou o impacto das redes.
Quando há personalidades mais vulneráveis, como traços de impulsividade, baixa autoestima ou necessidade intensa de validação externa.
Quando o uso das redes é intenso, passivo ou motivado por comparação social.
Quando há uma relação frágil com os pais, sem supervisão adequada ou diálogo sobre os riscos digitais.
Quando há forte influência de pares ou modelos digitais (como influenciadores) que promovem padrões irrealistas ou consumismo.
Quando a escola ou a comunidade não promove literacia digital ou competências de autorregulação.
Estratégias para um equilíbrio dinâmico
Aceitar que a tensão entre proteger e empoderar existe é o primeiro passo para gerir este paradoxo de forma construtiva. Proponho algumas estratégias:
Desenvolver a literacia digital desde cedo – Não apenas técnicas (como proteger a password), mas também críticas (como reconhecer influências comerciais).
Fomentar a autorregulação emocional e comportamental – Ajudar a criança a reconhecer os seus sentimentos, a lidar com a pressão social e a gerir o tempo de ecrã.
Promover relações significativas offline – Relações reais e seguras são a base para resistir a pressões nocivas online.
Envolver a escola, os pais e os profissionais de saúde mental – É uma responsabilidade partilhada. A criança não deve estar sozinha neste processo.
Estar atento ao conteúdo e ao contexto – A idade da criança, a finalidade da sua presença online, e o tipo de conteúdos que consome devem ser considerados.
E se não houver uma solução perfeita?
A ideia de que há um ponto ideal e fixo entre proteger e dar liberdade, é uma ideia que se afigura díficil de se concretizar. Em vez disso, a proposta é de um equilíbrio dinâmico, que se ajusta ao longo do tempo e de acordo com o crescimento da criança. A chave está na escuta activa, na presença consistente e na construção de uma relação segura.
Enquanto psicóloga, vejo diariamente os efeitos que este paradoxo pode ter no desenvolvimento emocional, social e identitário das crianças e adolescentes. A boa notícia é que há estratégias, recursos e conhecimento para transformar este desafio num espaço de crescimento saudável.
Não se trata de proibir, nem de deixar ao abandono.
Trata-se de estar presente, com empatia, conhecimento e responsabilidade.
Porque cuidar do bem-estar psicológico das crianças no mundo digital
é um dos maiores desafios e compromissos do nosso tempo.
Se este tema é importante para si, partilhe por favor o artigo com outros pais, educadores ou profissionais de saúde mental. E se precisa de apoio na gestão do uso digital dos seus filhos ou alunos, estou disponível para consultas e sessões de formação.
Fontes: Yap, S.-F., & Lim, W. M. (2023). A Paradox Theory of Social Media Consumption and Child Well-Being. Australasian Marketing Journal, 32(1), 65-75.